sexta-feira, 7 de março de 2008

O que foi o que eu vi...

Sempre gostei de ler no coletivo. Acho que é um gosto causado à força... para passar na merda do vestibular, meu trajeto (e cotidiano) era mais ou menos assim: 15 minutos até a estação de trem, 5 ou às vezes 25 minutos para esperar a locomotiva, senta ou fica em pé, 30 minutos de caminho, desce, espera outro trem (chamam isso de baldiação - nome mais estranho para por em "purgatório"), senta ou fica em pé, 30 minutos de trilhos, desce, anda 12 minutos até o ponto de van, chega a Van (com os cobradores declamando ou muitas vezes cantando o itinerário), senta, pois as locações são pequenas, pelo menos nessa época, desce no ponto, sobe uma ladeira que parece mais o caminho para o céu e finalmente toca a campainha e o porteiro diz "bom dia".
Puta-que-o-pariu! Esse palavrão (literalmente) é muito ínfimo para expressar o que passei para ir ao trabalho. E olha... eu nem contei a volta.
Foi assim que comecei a ler nos coletivos. Se conto isso, as pessoas dizem as mais variadas coisas:

- Vai descolar sua retina!
- Como você consegue? Eu não consigo!
- Caralho! Eu num leio nem parado...
- Tu é mentiroso pra cacete!

Mas fazer o quê? Eu escuto tudo isso, mas continuo lendo... E o som do deslizar do trem nos trilhos, a propaganda do camelô, o aviso da estação ("Estação Pinheiros... os assentos indicados são de uso preferencial, respeite esse direito") e o balançar do coletivo não me afligem. Parece que sou levado por esse vício. Engraçado que com a invensão dos MP3s, as pessoas ficam mechendo a boca como que quizessem dar um pulo do banco e começar a dançar.
Mas isso não acaba aqui! Não... o desejo se estende aos mais balangadores ônibus... O busão tem características diferentes do trem. Nele a leitura é um pouco diferente: como não há camelôs, acabo escutando as conversas (que não é agradável)... merda, não vale nem dizer.
Mas numa dessas leituras, estava eu com os olhos no parágrafo, quando o rádio fala "olha os cavalo-de-aço! Tá na Ponte! Corta! Quebra a João Dias se não você vaio se fudê!". Olhei para trás e tinha uns trocentos meganhas vindo de motoca atrás da lotação. O motorista, desesperado, tentou entrar na contra mão, em pleno sinal vermelho da Giovanni Gronchi. Nem deu tempo, o polícia mandou todo mundo descer e sair fora: "Vai, desce todo mundo!"
Depois chamei esse episódio de "Cavalo-de-Aço"... Nesses tempos, difíceis por sinal, os perueiros viviam a fugir dos homens... Aí veio a Martinha e começou a legalizar, num sei se deu certo, mas agora chamam eles de "cooperados". Bom, aí o buraco é mais embaixo.
E olha que ler em situações extremas causa algum tipo de êxtase. Não sei explicar, mas é.

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